Archive for the ‘Contos e parábolas modernas’ Category

O vendedor de balões

baloes     Um dia, estava uma criança negra num parque a observar um vendedor de balões. Este homem deixou soltar um balão vermelho, que atraiu o olhar de todas as pessoas presentes.

     A criança viu em seguida um balão azul a subir muito alto, depois um amarelo e, finalmente, um branco. Todos subiram nos céus até desaparecerem de vista.

     A criança negra ficou à espera que soltasse um balão preto. Mas começou a ficar surpreendida, pois o homem não se decidia a soltá-lo. Por isso, decidiu aproximar-se e perguntar-lhe: “Se soltar o balão negro, ele subirá como os outros?”

     O vendedor de balões sorriu compreensivo para a criança e, enquanto soltava o balão preto, respondeu: “Não é a cor, mas o que têm dentro, que faz subir os balões”.

de Pedrosa Ferreira in Cavaleiro da Imaculada, nº 893

Uma hora

relogio

 Uma criança perguntou timidamente ao pai quando este regressava do trabalho:
– Pai, quanto é que ganhas por hora?
O pai, friamente, respondeu:
– Para que queres tu saber? São dez euros por hora.
– Então, pai, poderias emprestar-me três euros?
– Então é por isso que queres saber quanto ganho por hora? Vai para a cama e não me aborreças mais!
Já era noite quando o pai começou a pensar no que tinha acontecido e sentiu-se culpado. Talvez o filho necessite de comprar algo. Entrou no quarto e perguntou-lhe baixinho:
– Filho, estás a dormir?
– Não, pai.
– Olha, aqui tens os três euros que me pediste.
– Muito obrigado, pai.
Depois a criança levantou-se, foi buscar os sete euros do mealheiro e disse ao pai:
– Agora já tenho dez euros! Pai, podias vender-me uma hora do teu tempo?

Os pais podem dar coisas aos filhos. Mas o que eles mais necessitam é que lhes dêem tempo para os escutarem.

In Cavaleiro da Imaculada, nº 888

Prenda das Bodas de Prata

idosos      Era um casal muito pobre e sem filhos.

     Ela fiava à porta da sua cabana pensando no marido. Toda a riqueza que ela possuía era uma bela cabeleira, gabada e invejada pelas mulheres da aldeia. Uma cabeleira negra, comprida, brilhante que brotava da sua cabeça como os fios de linho da sua roca.

     Ele ia ao mercado vender algumas frutas. Sentava-se à sombra de uma árvore a esperar, firmando entre os dentes o seu cachimbo vazio. O dinheiro não lhe chegava para uma pequena porção de tabaco.

     Aproximavam-se os 25 anos do seu casamento. Em anos anteriores, nessa data, nunca tinham oferecido nada um ao outro porque a pobreza não lhes permitia esse luxo.

     Mas agora tinha mesmo de ser. Vinte e cinco anos é uma data marcante que é preciso comemorar. Assim pensavam os dois em segredo sem falarem um ao outro sobre o assunto. Era preciso fazer uma surpresa.

     Uma ideia cruzou a mente da esposa. Sentiu um calafrio de alegria e tristeza ao pensar nela mas era a única maneira de conseguir algum dinheiro: venderia a sua cabeleira para comprar tabaco para o seu marido. Seria a melhor prenda que lhe podia dar. Ela imaginava-o já na praça, sentado atrás dos seus frutos, puxando longas cachimbadas e o fumo e evolar-se como aroma de incenso e jasmim a dar-lhe o prestígio e a solenidade de um grande comerciante.

     Só obteve pelo seu belo cabelo umas poucas moedas. Mas escolheu com cuidado o mais fino estojo de tabaco. O perfume das folhas enrugadas compensava largamente o sacrifício do seu cabelo.

     Ao cair da tarde regressou o marido. Vinha cantando pelo caminho.

     Trazia na sua mão um pequeno embrulho: eram alguns pentes para a sua mulher. Para obter dinheiro para os comprar tinha vendido o seu cachimbo…

Tradução livre de um poema de Tagore, in Almanaque Boa Nova 2008

Os milagres de que não damos conta

   precipicio

     Conta-se do grande pensador e filósofo francês Blas Pascal que certo dia marcou um encontro com um amigo num castelo, no alto de uma colina. Depois de um grande espaço de tempo em que o esteve esperando, este chegou com o rosto desfigurado, a roupa rota e o corpo cheio de contusões e feridas.
     – Que te sucedeu? – perguntou Pascal.
     – Não imaginas o milagre que Deus me acaba de fazer! – replicou o amigo. Quando vinha para cá, o meu cavalo resvalou à beira de uma ladeira. Eu caí e fui rodando e deslizando e detive-me precisamente à beira do precipício. És capaz de imaginar o que foi isto? Que grande milagre Deus me acaba de fazer!
     Ao que Pascal respondeu:
     – E que milagre me acaba de fazer Deus a mim, que quando vinha para cá nem sequer caí do cavalo!
     Quantos milagres faz Deus todos os dias por nós. Milagres que nunca vemos e de que nem sequer damos conta.

in Almanaque Boa Nova 2008

Deus é como o açúcar

Recados e Imagens - Paisagens - Orkut

      Certo dia um sacerdote foi a uma escola falar de Deus.
      Quando chegou perguntou às crianças se conheciam Deus. Elas responderam que sim.
      Então ele perguntou: Quem é Deus?
      Elas responderam:
      – Deus é nosso Pai. Ele fez a terra, o mar e tudo o que existe. E fez de nós seus filhos…
      O sacerdote resolveu adiantar um pouco a sua pergunta:
      – Como é que vós sabeis que Deus existe se vós nunca O vistes?
      A sala ficou toda em silêncio durante uns momentos. Por fim, Pedro, um menino muito tímido, levantou a mão e disse:
      – A minha mãe disse-me que Deus é como o açúcar no leite que ela me prepara todas as manhãs. Eu não vejo o açúcar que está dentro da chávena de leite, mas se ela não o colocar, o leite fica sem sabor. Deus existe e está no meio de nós, só que nós não O vemos. Mas, se Ele não estiver perto, a nossa vida fica sem sabor.
      O sacerdote disse:
      – Muito bem, Pedro! Agora sei que Deus é o nosso açúcar. É Ele que adoça todos os dias a nossa vida.

in Almanaque Boa Nova 2008

As pedras da montanha

pedras

    Vamos até à montanha onde Deus mora, comentou um cavaleiro com seu amigo. Quero provar que Ele só sabe pedir, e nada faz para aliviar o nosso fardo.
    – Pois vou demonstrar minha fé – disse o outro.
    Chegaram à noite ao alto monte e escutaram uma Voz na escuridão:
    – Encham seus cavalos com as pedras do chão!
    – Viu?! Disse o primeiro cavaleiro. Depois de tanto subir, Ele ainda nos faz carregar mais peso. Jamais obedecerei!
    O segundo cavaleiro fez o que a Voz dizia.
    Quando terminaram de descer o monte, a aurora chegou, e os primeiros raios de sol fizeram ver que as pedras que o cavaleiro piedoso havia trazido eram diamantes puríssimos.

Paulo Coelho

Querendo encurtar caminho

    “Por que o senhor nos faz perder tempo buscando Deus, quando já o conhece tão bem?”, disse um discípulo de Hasan de Basra. “Podia contar-nos como Ele é”.
    “Sim”, respondeu Hasan de Basra. “Mas acontece que, certa tarde, eu estava diante de um pântano, quando reparei que um homem se preparava para atravessá-lo. Gritei: cuidado, porque você pode escorregar numa pedra e molhar-se todo!”.
    O homem me respondeu: “Se isto acontecer, eu serei o único a ficar sujo. Entretanto, Hasan, se você escorregar e cair no seu caminho, todos os seus discípulos escorregarão e cairão contigo”.
    “A partir deste momento, compreendi: Deus é um desafio individual, cada pessoa é responsável por sua busca. Um mestre pode compartilhar sua experiência, mas nunca os seus resultados”.

de Paulo Coelho

Deixa entrar o sol

sol 

      Um homem perdera a esperança no amor de Deus.
    Um dia, enquanto andava pelas colinas ao redor da sua cidade, encontrou um camponês que, ao vê-lo aflito, lhe perguntou:
    – Amigo, que cara é essa tristonha que trazes?
    – Sinto-me imensamente sozinho.
    – Mas eu também estou sozinho e sinto-me alegre.
    – Talvez Deus esteja consigo.
    – Adivinhou!
    – Eu, pelo contrário, não sinto a presença de Deus. Não consigo acreditar no seu amor. Como é possível que Ele ame os homens, um a um? Como é possível que Ele me ame?
    – Você está a ver lá em baixo a nossa cidade? – perguntou o camponês. Você consegue ver todas as casas? Você está a ver as janelas de todas as casas?
    – Claro que sim!
    – Então não perca a esperança! O sol é um só, mas todas as janelas, mesmo as mais pequenas e escondidas, recebem os seus raios todos os dias, logo de manhã. Acho que se você está triste e sem esperança é porque a sua janela está fechada.

(Conto árabe)

A esperteza do burro

 

   Um dia, o burro de um aldeão caiu num poço.
   O animal zurrou fortemente durante algumas horas, enquanto o dono procurava ajuda para o retirar. Não a encontrando, acabou por decidir que, sendo o burro já  velho e estando o poço seco, o melhor era tapar o poço e não valia a pena tirar o burro.
   Convidou então todos os vizinhos para o ajudarem.
   Cada um pegou numa pá e começaram a atirar terra para dentro do poço.
   O burro, ao ver o que se estava a passar, começou desesperadamente a zurrar.
   Mas, pouco depois, para surpresa de todos, calou-se, e só se ouvia o som das pazadas a cair. O aldeão, olhando para o fundo do poço, ficou surpreendido ao ver o que o burro estava a fazer. Sacudia a terra que ia caindo nas costas e dava mais um passo para cima da terra.
   Rapidamente, todos viram, com espanto, como o burro chegou à boca do poço, saltou por cima dos bordos e partiu…

blue

   A vida vai-te atirar muita terra para cima, terra de todos os géneros. O segredo para saires do teu poço é sacudi-la e usá-la para dares um passo para cima. Cada um dos nossos problemas é um degrau para subir. Assim, podemos sair dos vazios mais profundos, se não nos dermos por vencidos… Usa a terra que te atiram, para caminhares em frente.

Saber escolher

pomba

   Uma vez um rapaz orgulhoso e convencido quis armar uma cilada a um velho eremita, considerado por todos como um homem sábio.
    Apanhou um pássaro vivo e pensou: “Agora vou provar a todos que sou mais esperto do que o velho. Ponho o pássaro vivo entre as minhas mãos e pergunto-lhe: ‘O pássaro que tenho nas mãos está vivo ou está morto?’ Se ele disser ‘está morto’ abro as mãos e solto o pássaro. Se ele disser ‘está vivo’, mato o pássaro entre as duas mãos e provo que ele está errado.”
    Com o pássaro nas mãos, como tinha planeado, o rapaz foi junto do sábio e perguntou:
    – O pássaro, nas minhas mãos, está vivo ou morto?
    O velho eremita, calmamente disse:
    – Meu filho, está tudo nas tuas mãos, depende da tua escolha.
    A todo o momento temos que escolher entre o que é, ou não, honesto, correcto e bom. Saber escolher é o grande segredo de uma vida feliz.